Imagine um tempo em que metade da Europa estava envolta em uma “Cortina de Ferro”, uma barreira política e ideológica que isolava nações inteiras. Para os cristãos que viviam sob regimes comunistas, a perseguição era real, a vigilância era constante e a Bíblia era um livro proibido. Nesse cenário de medo, um jovem holandês, ex-soldado, sentiu um chamado de Deus. Sua arma não era um fuzil, mas uma mala cheia de Bíblias. Seu veículo de combate era um modesto Fusca azul. Este homem ficou conhecido como Irmão André, e sua história nos mostra como a fé radical e a oração ousada podem romper as barreiras mais impenetráveis criadas pelos homens.
De Soldado Ferido a Missionário Ousado

Seu nome de batismo era Anne van der Bijl. Em sua juventude, ele não tinha nada de santo. Como soldado do exército holandês nas Índias Orientais (atual Indonésia), ele viveu uma vida de batalhas e excessos. Foi lá que um ferimento a bala no tornozelo o colocou fora de combate e o fez mergulhar em uma profunda crise existencial. De volta à Holanda, em sua convalescença, ele começou a ler a Bíblia que sua mãe lhe dera. E, pela primeira vez, as palavras fizeram sentido. Em uma noite, em seu quarto, ele se rendeu completamente, orando algo como: “Senhor, se me mostrares o caminho, eu Te seguirei”. Mal sabia ele que o caminho o levaria para os lugares mais perigosos do mundo.
A Viagem que Mudou Tudo: O Chamado para a Igreja Perseguida
Em 1955, Irmão André sentiu-se guiado por Deus para ir a um Festival Mundial da Juventude na Polônia, um país comunista. O que ele encontrou lá partiu seu coração. Ele viu igrejas desanimadas, isoladas do mundo e famintas pela Palavra de Deus. Bíblias eram extremamente raras e possuí-las era perigoso. Ele participou de um culto e, mesmo sem entender a língua, sentiu a opressão e a necessidade daquela pequena congregação. Foi ali, lendo sua própria Bíblia, que seus olhos caíram sobre um versículo que se tornaria a missão de sua vida: “Esteja atento! Fortaleça o que resta e que estava para morrer” (Apocalipse 3:2). Naquele momento, ele entendeu seu chamado: Deus não o estava enviando para plantar novas igrejas, mas para encontrar e fortalecer seus irmãos e irmãs que estavam sofrendo sozinhos atrás da Cortina de Ferro.
A Oração do Contrabandista: “Senhor, Cega os Olhos que Veem”

A partir daquele dia, Irmão André começou suas viagens “missionárias” para dentro de países comunistas. Seu método era um ato de fé pura. Em vez de esconder as Bíblias em compartimentos secretos, ele as empilhava à vista de todos, no banco do passageiro de seu Fusca. Ele acreditava que esconder as Escrituras era demonstrar medo e falta de fé no poder de Deus para protegê-lo. A verdadeira proteção vinha da oração. Ao se aproximar de cada fronteira fortemente guardada, ele fazia uma oração simples e ousada, que se tornou sua marca registrada: “Senhor, em minha bagagem tenho Tuas Escrituras. Quando estiveste na terra, fizeste com que os olhos cegos vissem. Agora, eu oro para que faças com que os olhos que veem se tornem cegos.” E os milagres aconteciam. Vez após vez, guardas de fronteira carrancudos e meticulosos o mandavam passar com um aceno, sem nem mesmo olhar dentro do carro. Em outras ocasiões, revistavam tudo — debaixo dos assentos, o porta-malas, seu casaco — mas seus olhos simplesmente não viam as pilhas de Bíblias bem ao lado deles. Eram milagres da fé, que permitiam que a esperança da Palavra de Deus chegasse às mãos de quem mais precisava.
De um Homem a um Movimento: O Legado da Missão Portas Abertas
O que começou com um homem e seu Fusca azul logo se tornou grande demais para ele. As necessidades eram imensas, e os pedidos por Bíblias vinham de toda a Europa Oriental. Irmão André percebeu que precisava de ajuda. Ele começou a treinar outros cristãos corajosos para fazerem o mesmo trabalho, compartilhando suas histórias e sua fé de que Deus proveria e protegeria. Essa rede informal de “contrabandistas de Deus” cresceu e, em 1957, se tornou a base para a organização que hoje conhecemos como Missão Portas Abertas (Open Doors). O ato de obediência radical de uma única pessoa, que simplesmente decidiu “fortalecer o que resta”, gerou um movimento global que hoje serve e apoia a Igreja Perseguida em mais de 60 países ao redor do mundo.
Aplicação Prática: O Que Podemos Aprender com o Contrabandista de Deus?
- A Oração Ousada Move a Mão de Deus: A oração do Irmão André não era uma fórmula mágica, mas uma declaração de total dependência. Ele nos ensina a orar com uma fé que espera que Deus intervenha de forma sobrenatural em situações impossíveis.
- A Obediência Começa com Um Passo: Ele não recebeu um plano detalhado para criar uma organização global. Ele recebeu um chamado para ir à Polônia. Deus frequentemente nos chama para dar o próximo passo de obediência em nossa frente, confiando que Ele revelará o resto do caminho no tempo certo.
- Fortaleça o que Resta: A missão de Irmão André era encorajar a igreja que já existia. Isso nos desafia a olhar ao nosso redor. Quem em nossa igreja, em nossa família ou em nosso círculo de amizades está enfraquecido e precisando de apoio, de uma palavra de encorajamento — de uma “Bíblia”?
A história do Irmão André nos confronta: Qual é a nossa “Cortina de Ferro” hoje? Que barreira o medo, o conforto ou a conveniência nos impede de cruzar com o evangelho? Compartilhe nos comentários!